segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Mais uma Crônica

De escritor e louco, todos temos um pouco.

Diretamente da seção mais exótica da Adega...

Bom proveito!

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No consultório.

“Doutor, eu sou escritor, mas sou gente que nem qualquer advogado, médico, engenheiro, jornalista, diretor de cinema, carteiro, gigolô, etc., mas eu acho que meus problemas são maiores, não sei explicar bem. Magnitude incomensurável, pleonástica! É um turbilhão de coisas que atravessam minha mente. Problema dos outros, peculiaridade das coisas, cores, brilho, um turbilhão! Eu não sei muito bem explicar como acontece, eu penso em uma coisa e outras dez sobrepõem-se a ela, e elas se misturam, brigam, se separam e se condensam. Tudo numa dinâmica simultânea impressionante. É difícil demais para eu administrar sozinho. Já criei três amigos para me ajudar na tarefa! Se um sujeito começa a rir, eu já começo a desconfiar o porquê dele estar rindo, nem que seja só uma risadinha dessas sem graça e de canto de boca. Tem que ter um motivo! E se alguém chora, eu quase choro junto, me comovo, participo mesmo, com intensidade. Isso sem falar das coisas que às vezes se mexem, ganham vida, às vezes até falam e aí criam e possuem histórias difíceis de entender e eu preciso de muita concentração para conseguir atravessar esse caminho complexo em que elas acabam me inserindo. O tempo também não é muito meu amigo, assim como o espaço e até o próprio vento, que se soprar pro lado errado pode misturar ainda mais todas as coisas e eu fico no meio de um tornado maluco de muitas histórias que insistem em não me deixar dormir. Eu só penso em tudo, a todo o tempo. Já estou até andando com bloco de notas e caneta, pra não me perder no meio de ninguém, nem de nada. Agora tenho tudo controlado, até meu remédio, que por sinal mudou a cor da tarja. Descobri por mim mesmo que a ausência de cor me acalma mais. Não que eu seja o retrato da paciência e do controle próprio, muito pelo contrário. Se às vezes eu consigo sentar e pensar em situações com alguma conexão, devo isso àqueles designers de caixinha de remédio que inventaram a bendita tarja. Santos mestres das cores... Ah, como eu adoro as cores! Elas deixam meus monstros e os meus anjos mais coloridos, o que é bom, porque quando eles começam a guerrear muito, minha massa encefálica tem algum momento de paz: é quando todas as cores se misturam e o branco criado me faz bem de verdade. Não quero parecer um Nietzsche, ou qualquer outro maluco desses da história. Não que eles sejam malucos e não mereçam a fama toda que têm pelo que fizeram, mas eles são malucos, e eu não sou megalomaníaco ao ponto de querer alcançá-los, exceto pelos meus problemas, que são pleonásticos de tão grandes, como já bem lhe disse. Eu sei que não estou maluco, e vim aqui para me assegurar disso, se não para quê serviria uma analista, não é mesmo? Eu só quero mesmo um diagnóstico para saber o que devo escrever no próximo e-mail desesperado a ser enviado ao designer da tarja do remédio pra inventar uma cor mais forte, porque sem cor, não dá mais para ficar! Não é só isso, mas é isso, afinal”.

Analista: 

 - Mas está claro que sua doença é crônica!

Acertou na mosca. Era só mais uma crônica.


Autor: Jorge Pedrosa

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Papagueando

Mais uma que nos remete à série: "Eleições 2010".

Bom proveito!

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Estava assistindo televisão quando começou o horário eleitoral. Que saco. Em época de eleição é sempre a mesma coisa. À noite, a programação é interferida pelo horário eleitoral. No início, são destinados 30 minutos, no período da manhã e da noite, e perto das eleições, são 50 minutos de pura agonia, algazarras e rogativas, na minha humilde opinião. Todo dia aguento o horário eleitoral. E o pior não é assistir, é ter de escolher os candidatos.
São homens e mulheres ponderando, convocando e, às vezes, implorando para que eu ajude a transformar o país. Até parece... Que juntos faremos melhorias na saúde, educação, economia, e por aí vai. São tantos pedidos de gente atrapalhada que fico sem reação. Pedem meu voto e de meus familiares, piorou! Mamãe não tem idéia em quem votar e sempre fica me adulando com a mesma ladainha: “Filha, em quem nós votaremos?”. Eu sempre respondo com o mesmo discurso: “Eu, ainda não decidi. Agora, em quem você vai votar, não tenho idéia”.  
Por sua vez, o namorado de mamãe já tem tudo definido. Influente e curioso pelo mundo da política, ele vive nos criticando pela forma como tratamos o assunto. “Se vocês que julgam ser o povo não têm a preocupação de votar, por que o fazer?”. Não tiro a razão dele. Só penso que os candidatos não parecem levar a sério o assunto. Não na magnitude que se carece. E Belinha me apóia. Pelo menos repete quase tudo que falo. Belinha é um pequenino papagaio que ganhei de titia. Parecido com os que existem nos zoológicos.

Passeio
Tive de sair de casa. Fernando, o namorado de mamãe, quando dispara a falar sobre política, nem Cristo agüenta. Peguei Belinha e avisei que ia dar uma volta. Deixei mamãe sozinha para aguentar o fardo político. “Tadinha!”, matutei. Se eu permanecesse, sabia que o bate papo resultaria em discussão. Ao sair de casa, encontrei papai na rua e Fui cumprimentá-lo. Belinha não perdeu a oportunidade de se mostrar “Olá Pepê! Pepê! Pepê!”, papagueava. Esse era o apelido dele. Eu e papai começamos a rir. E papai, como de costume, fez aquele comentário “Ê mundo animal, sempre nos surpreendendo!”. Em seguida, ao começarmos uma conversa, um amigo dele chegou. Mal soltou um “Boa noite” e já desandou a falar sobre a tal política. Fiquei indignada e o ignorei. Só não percebi que, antes de ignorá-lo, eu é que fui deixada de lado. Até por papai. Fiquei revoltada, só que mantive a calma e permaneci. 
O amigo falava empolgado, discorrendo sobre as falcatruas de fulano, apoio a ciclano e beltrano, e papai assentia com a cabeça, concordando. Eu não acreditava no que estava vendo e ouvindo. Fiquei estarrecida no momento em que disseram que era melhor votar em alguém que fosse realizar alguma coisa boa. “Boa para eles”, pensei e disse. Ambos me olharam. Então, tive de falar o que pensava. “Como podem julgar que determinada pessoa fará alguma ‘coisa boa’ para vocês?”, adverti. “São tão especiais que merecem privilégios? Ou acreditam que o mundo gira em torno de vocês?”, rematei. “Tolos! Tolos! Tolos!”, tagarelava Belinha, enquanto eu sentia uma rápida sensação de rir. E eles permaneceram em silêncio, me observando.  
Na verdade me senti mal protagonizando a cena. Dei as costas e me retirei com Belinha. A caminho de casa fui refletindo sobre o acontecido. Em como ainda existem pessoas que apreciam a troca de favor, venda de voto, e votam em qualquer candidato. Lembrei que, antes de sair de casa, ao ignorar o assunto, eu era exatamente assim. 
Ao chegar em casa, notei que os ânimos estavam mais serenos. E o horário eleitoral não havia acabado. Sentei no sofá com Belinha para assistir. Dessa vez, fui avaliando as propostas dos candidatos e partidos, enquanto Belinha repetia tudo o que era falado na televisão. Ao terminar o programa, cheguei a uma conclusão. “Belinha, precisamos alertar as pessoas, entre elas, mamãe e papai, sobre o poder de decisão do voto. E, sobretudo, que existem candidatos sem saber o que fazer no governo. Acreditando que com eles, pior do que está, não fica”, desabafei. E Belinha, parecia ser a única que me compreendia. “Precisamos alertar! Alertar! Alertar!”, papagueava incontrolavelmente.


Autor: Fernanda Gomes



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quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Festival de Twitteratura

Bons movimentos merecem boas referências. Um conto em 140 caracteres? Interessante... Vale a pena tentar!

Uma verdadeira fábrica de ideias.

Mais informações em www.shoppingpcosta.blogspot.com ou através do twitter @shoppingpcosta
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É isso aí Galera, está no ar o 3º Festival de Twitteratura Shopping Praia da Costa. Como a maioria já sabe, o concurso consiste na elaboração de nanocontos obedecendo as regras do microblog Twitter: as histórias deverão ter até 140 caracteres, e devem ter início meio e fim.

Nas duas primeiras edições do evento foram recebidos aproximadamente 600 nanocontos, cerca de 300 em cada uma. A expectativa é que dessa vez o número de participações chegue a 450!!

O humor é parte integrante da nova onda, pois, ainda que seja escrita uma história triste, é interessante observar o poder criativo dos participantes. A Twitteratura é divertida, exige intensidade e rapidez de raciocínio, uma vez que critérios difíceis de serem estabelecidos como coesão, coerência e enredo devem ser inseridos em um espaço reduzido. E cortar palavras não é tarefa fácil (que o digam os twitteiros menos experientes!). O resultado é sempre satisfatório e inesperado, pois pode-se medir o grau de criatividade e observar as diferentes variações sobre as percepções de cada um sobre diversos assuntos.

Para participar o internauta deve enviar seu microconto, via Twitter para a página do Shopping Praia da Costa, usando @shoppingcosta. (Regulamento disponível em:http://migre.me/1DnIX). Os 10 melhores contos serão avaliados por um corpo de jurados formado pelo Doutor em Semiótica e professor da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo), Raimundo Carvalho, pelo Professor de Marketing e Novas Mídias também da UFES, Ruy Roberto Ramos e pela jornalista e mestranda em Estudos de Linguagens pelo CEFET/MG, onde desenvolve pesquisa sobre Twitter, blogueira e consultora, Roberta Camargo.

O melhor autor entre todos os microcontos levará para casa um leitor de livros digitais, com agenda e gravador de voz. Tente você mesmo, conte as palavras, aperte os espaços e ponha a cabeça para funcionar. Um conto em 140 caracteres não poder ser tão difícil...
Para se inspirar, confiram os contos vencedores do 2º Festival de Twitteratura, realizado em maio deste ano:

1º LUGAR @_ludmilla_ @shoppingpcosta Poder patriarcal, casamento precoce, violência, silêncio, desilusão, voz, divórcio. Aos 61 anos, Maria conheceu a liberdade.

2º LUGAR @steph_q @shoppingpcosta Eu pensava que o mundo lá em cima era ruim. Agora, já era né?! Já volto! Vou ali comer o pão que o diabo amassou. Resmungou.

3º LUGAR @brunobarrett @shoppingpcosta Certa manhã, voava a garça quando o menino que olhava a vidraça subitamente ficou vidrado. O feitiço nunca foi quebrado.

Cronograma 3º Festival de Twitteratura Shopping Praia da CostaLançamento: 19/10
Período para recebimento dos contos: até 03/11
Divulgação do resultado: 10/11
Os contos enviados pelos participantes deverão ter no máximo 140 caracteres, sendo que deverá constar no conto o prefixo @shoppingpcosta e serão analisados com base nos critérios de ortografia, legibilidade e concordância.

Confira o regulamento em: http://migre.me/1DnIX

sábado, 16 de outubro de 2010

Incomodador Fascínio

Adaílton: A partir de agora, futuro assassino de duas pessoas.

Eu: Sujeito que cai de paraquedas no campo minado de uma mente aleatória.

Outros: São outros, só outros. Mas eles mesmos.

Inocência: Fenômeno relativo e suscetível a fatores desconexos.


Bom proveito!

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“Não sei por que você se foi, quantas saudades eu senti, e de tristeza vou viver, e aquele adeus, não pude dar...”. Era exatamente essa a música que saía do fundo daquele copo de cerveja quente, naquela noite de verão atipicamente fria de um bar qualquer, onde gordura no copo é o menor dos males sanitários. Já tinha perdido as contas de quantos copos aquele sujeito havia bebido. Aqueles olhos de breu marejados me causavam alguma coisa que eu não sei muito bem explicar. Vou utilizar a palavra ‘incômodo’. Eu bebia vodka, mas os efeitos do meu copo cheio – não importa quantos fossem – não se comparavam nem um pouco à ação daquela simples cerveja sobre aquele moço. A cena era fascinante e incômoda – não sei por que penso tanto –, o título já me diria. Era exatamente isso. Estava imerso em torpor daquele fascínio incomodador.
            Permaneci com ele nos versos da canção durante alguns minutos, fitando a certa distância aquela cena ligeiramente inconveiente. A banda era meio desafinada, mas, para quem não estava a fim de pagar o couvert artístico, o som parecia excelente. Em certo momento ele se levantou para ir ao banheiro e passou por minha mesa e, trôpego, apoiou-se na cadeira ao meu lado, desequilibrou-se, caiu e vomitou. Perguntei se estava tudo bem. Ele vestiu um resto qualquer de dignidade perdido naquela imundície, levantou-se e continuou a saga ao sanitário. Quando o homem voltava, não me contive e perguntei se poderia fazer-lhe companhia. Ouvi um “não, obrigado” grave, saído meio baqueado, e voltei para meu lugar, esperando mais uma dose.
            Um tempo depois, chegou minha companheira Marieta – uma das mais bonitas do bairro. Eu estava apaixonado e era a primeira vez que saíamos. Ela sentou-se ao meu lado, me deu um beijo no rosto e pediu o cardápio. Depois de um minuto de silêncio à mesa, olhou em minha direção e perguntou: “Que cara é essa?”. Foi o momento em que percebi o quanto incomodado estava com a situação criada, provavelmente por mim mesmo. Já fazia uns dois meses que eu insistia em sair com a Marieta e, quando consigo, não era capaz de ceder nem metade da devida atenção ao meu objeto de desejo. Expliquei então a ela sobre o sujeito da mesa próxima e ela não deu muita bola: “Loucura da sua mente mirabolante de escritor menestrel”, respondeu irônica.
            Após meia hora de nulidade verbal, Marieta parecia impaciente e simplesmente me disse: “Quer saber de uma coisa, eu nem sei o motivo de eu ter vindo aqui aguentar mau-humor de um fodido como você. Ou você conversa direito, ou tchau!”. Só consegui abrir a boca e dizer “tchau”. Ela levantou-se e partiu. Mas eu estava incomodado e, agora, deprimido demais para falar qualquer outra coisa. Chegava mais uma cerveja na outra mesa. A banda já cantava melhor. O álcool melhora as coisas. Mais uma dose, por favor. O mundo é mais divertido quando gira.

Desabafo
            “Meu amigo, me desculpe. Mas queira você ou não, é aqui que eu vou ficar. Quem paga a conta dessa bosta hoje sou eu! Solidão sai pra lá, que aqui não é o seu lugar!”. A rima acusava meu estado ébrio, e as palavras refletiam exatamente meu espírito determinado quando sentei na cadeira de frente para aquele protótipo deplorável. Encarei-o e disse que podia tratar de falar logo o que estava acontecendo porque se não nem ele, nem eu, curtiríamos nossa bebedeira direito. Acho que fui muito rude, ou então meu novo amigo era sensível em excesso. Apoiou a cabeça na mesa, e com a boca meio de lado, meio torta, ele começou a balbuciar alguma coisa que, apesar do agitado som da banda, eu cheguei mais perto e consegui entender.
-        Eu não precisava de ninguém comigo hoje, mas obrigado por ter vindo. A ideia de morrer sozinho me apavorava. Eu não bebo, mas hoje precisava fugir de mim mesmo, pois o suicídio é coisa vergonhosa. Matei minha mulher há meia hora. Eu não sou daqui, vim apenas atrás dela depois que ela fugiu com meu melhor amigo. Não se importe comigo, porque sei para onde vou. Gente que comete pecados iguais aos meus e dela se encontra no mesmo lugar. Lá eu vou poder reencontrá-la e, quem sabe, reconquistar o amor que não cultivei muito bem na Terra. Meu hálito é ruim em virtude do veneno que tomei, de ação lenta, que é pra dar tempo de me embriagar. Afinal quando tá bêbado a gente não tem vergonha de fazer coisa feia.
            Logo, estava morto, e era Adaílton. Tinha nome, o tal homem. O garçom me contou toda a história depois. Adaílton era sujeito sozinho na vida, só tinha a esposa. O funcionário do bar soube da história através da própria defunta. Veja só que insólito: era ele, o garçom, o tal amante da mulher e melhor amigo de Adaílton. Serviu as últimas bebidas de graça atendendo à última rogatória de um desertor da vida. Ainda teve tempo de escutar a frase derradeira que veio antes do último suspiro de vida do amigo, quando correu à mesa depois de ouvir o baque da cabeça que despencou: “Você é meu amigo, e amigo a gente escolhe para amar, ainda que erremos na escolha. Eu te amo. Até breve”.
            Conheci um sujeito especial naquela noite. E hoje tenho alguma convicção de que o Adaílton conseguiu o que queria, porque sonho com ele. E ele sorri um sorriso que eu não poderia inventar: eu nunca o vi sorrindo em vida. Era sorriso mesmo, de dentes arreganhados, de dever cumprido, recheado de espírito puro e sincero. Até hoje eu volto àquele bar para ouvir aquela banda desafinada que depois fica boa e sempre me emociono quando ouço o “Não sei porque você se foi...”. A cada encontro, tudo está do mesmo jeito. Joaquim, o garçom, ainda trabalha por lá e o repertório não mudou uma palavra. 



Autor: Jorge Pedrosa



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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Nossa Marcha Mocha

 Texto enviado por: Noriana Seefeld Behrend

Vale a leitura. Sabor agradável.

Saúde!

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Já reparou que nossa vida é cercada por marchas de toda sorte? Marcha nupcial, Marcha de carnaval, Marcha cívica, Marcha ré e tanas outras. Cada qual a seu tempo e hora. O raciocínio pode parecer mirabolante a primeira vista, mas serve para ilustrar o condicionamento social a que somos submetidos desde sempre e, ao que parece, para todo sempre. Até que a morte nos separe, com perdão do trocadilho.
Que dizer sobre estereótipos presentes todo tempo na mídia regendo nossas aspirações? Há quem diga que toda ação gera uma reação. Nesse caso catastrófica, apregoando conceitos inatingíveis de beleza. Temos o péssimo hábito de taxar o que é estranho de ruim, ou seja, ser diferente não parece normal, apesar de algumas peças publicitárias dizerem o contrário. Enquanto reforçarmos a intolerância e o preconceito esses cânceres sociais não serão extirpados.
Se o cara for negro, pobre e analfabeto é bandido por tabela. Dedução arbitrária calcada em pressupostos insólitos, que o diga a nação verde-amarela de Marias e Joões espalhados do Oiapoque ao Chuí.
Mesmo assim, as comemorações cívicas do sete de setembro sempre emocionam, sendo uma oportunidade única de demonstrar patriotismo e orgulho de ser brasileiros. E a oportunidade de assistir a belos desfiles em todas as capitais brasileiras.
Talvez o leitor não concorde comigo e faça conjecturas do tipo: “Orgulho de ser brasileiro eu tenho é em época de copa do mundo.” No entanto, aposto que ao puxar na memória lembrar-se-á de momento ou personagem marcante relacionado a essa data comemorativa.
Fato que aconteceu comigo há muito anos no dia sete de setembro — e que mudou minha percepção acerca dessa data para sempre — aconteceu certo dia de calor escaldante. Eu era uma doce e sonhadora menina — apenas mais patriota que as demais — a quem o pai levava pela mão, ano após ano, para assistir ao desfile da banda militar. O dia estava perfeito: céu azul, instrumentos afinados, marcha em sincronia, fardas impecáveis, símbolos nacionais, posturas respeitosas, bandeiras do Brasil, etc.
  • Relembrando
No meio da multidão — enquanto soavam os primeiros acordes do hino nacional — ao longe se via um homem de cabelo pixaim, rosto moreno, trajando paletó amarelo e camisa de casemira azul. Ele olhava entristecido para a banda que seguia pela Avenida da cidade. Assistia introspectivo à cena, emudecido diante da multidão que cantava acalorada: “Ouviram do Ipiranga às margens plácidas, de um povo heroico brado retumbante”.
Fiquei intrigada com a atitude passiva daquele homem e perguntei ao meu pai quem ele era. Disse se tratar do ex-sargento Passarinho, regente durante muitos anos da banda militar. Que abandonara a exercício da profissão e a música por causa da bebida. Todos os anos no dia sete de setembro ele vinha ao desfile cívico, era a sua maneira de aplacar as saudades e de espantar a solidão.
Os Policiais prestariam linda homenagem naquele dia ao sargento passarinho. Executado o hino nacional bateram continência ao amigo que acompanha tudo de longe, aturdido com aquele desfecho. O atual regente também recitou um trecho do poema de Mário Quintana: “Todos esses que aí estão/ atravancando o meu caminho, / eles passarão... / eu passarinho!”.
A ideia mirabolante dos ex-colegas de farda causou frisson entre os presentes e também no homenageado. Aplausos ecoaram durante alguns instantes. Desse dia em diante entendi o real sentido do sete de setembro. Mais que data cívica aquele dia passou a representar para mim o reencontro com a essência do ser brasileiro: perseverante e talentoso por natureza, mesmo em face dos reveses da vida.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

O conselheiro que toda cidade gostaria de ter

Entre a verdade e a ficção, que tal um pesquisa? Um pouco mais de Antônio Conselheiro, mais um sujeito tipicamente brasileiro. Cearense de Quixeramobim, provavelmente nascido em 1830, o beato é nativo da história do país!

Saudações, Conselheiro!

Conto enviado por Andressa Rocon.

Aproveite!

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Imagem de "Os Sertões" - Euclides da Cunha



Antônio Conselheiro foi um líder importante na Cidade de Canudos

De Conselheiro muitos diziam que Antônio não tinha nada mas, como nos dias de hoje, não é possível agradar a todos, Naquela época a situação não era diferente.  Antônio Conselheiro foi um importante líder comunitário da cidade de Canudos, na Bahia.  Poucos sorrisos o acolhiam e, pela manhã, seguia a rotina sem se preocupar com a opinião das pessoas. 
Os desabrigados do sertão e as vítimas da seca eram recebidos de braços abertos por Conselheiro. Era uma comunidade onde todos tinham acesso à terra e ao trabalho sem sofrer as agruras dos capatazes das fazendas tradicionais. Um "lugar santo", segundo seus adeptos. Os grandes fazendeiros e o clero começaram a perceber que o poder estava sendo ameaçado pelo líder, e começavam a se articular em busca de "solução". Fizeram de tudo para que Conselheiro deixasse Canudos.
Quem via Antônio naquele estado de solidão não imaginava de todo seu sofrimento e das idéias mirabolantes que lhe passavam à mente. Antonio Conselheiro fazia parte de uma banda: a maioria na cidade era contra, alguns diziam que pertencia a algo satânico e que no local em que se apresentassem a má sorte reinaria.  
Antônio se desintegrou da banda. O afastamento trouxe problemas à cidade, as pessoas agora realmente começavam a acreditar na tal má sorte, dessa vez na certeza de que da separação viria à tona os problemas. A cidade sempre fora muito unida e organizada, no momento encontrava-se totalmente desestruturada. Não é para menos, o líder compreendia cada ponto da cidade, entendia cada pessoa e, certamente, a ausência de Conselheiro seria um dos motivos da desordem.
Passava horas a dialogar com aqueles que necessitavam conforto.  Coisas insólitas começam a aparecer, as pessoas que julgavam Antônio Conselheiro não admitiam que era figura essencial em Canudos e até nos problemas políticos o envolveram.

Reencontro
Um reencontro era preciso, o pensamento de que o líder comunitário  tinha de voltar já estava encaminhado. Mas em que lugar estaria o homem que tanto fez pela cidade e muitos não deram valor? Onde reencontrá-lo? A banda também sentia falta.
De longe se aproximava um homem cuja aparência parecia com a de Antônio Conselheiro. A banda rapidamente se apressou: vestiram os uniformes e pegaram-se os trompetes. De cabelos curtos e sapatos nos pés, o homem usava um terno amarelo e calça marrom. Quem via pela primeira vez não imaginava o que aquele homem havia feito pela cidade.
 Ele vinha ao encontro e carregava uma expressão triste. A banda não se conteve e os músicos correram para abraçá-lo. Ele, no entanto, assustado, não deu muita importância e os componentes da banda ficaram indignados com a recepção. O homem confuso não entendia a quem eles declaravam tanta paixão. Chamavam-no por Conselheiro: "Conselheiro!". Após os gritos, o homem entendeu de quem tratava e explicou que veio trazer a notícia de que Antônio Conselheiro havia se enforcado. A banda não se conformou e acreditava que a Cidade de Canudos também não se conformaria.
            Em um mundo evoluído, globalizado, dotado de tecnologias que se alteram todos os dias, muitos ainda não acreditam no valor que tem as pessoas, e muitas vezes não dão importância. Canudos viveu esse episódio, a velha frase, mas não menos importante “As pessoas só dão valor quando perdem”, remete a ideia. A falta de um Conselheiro em Canudos tornava-se algo de necessidade, o que no entanto, era tarde demais.



Autor: Andressa Rocon



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segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Linguajar

 Curta, mas saborosa! Esperamos que curtam!

Às mãos: mais um sabor; curtido na Adega.

Saúde!
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Ela vai ao céu quando bem entende. Viaja, ziguezagueia, passeia sem que ninguém perceba. Muitos veem, poucos notam e quase ninguém presta atenção: os poucos que são ariscos se arriscam ao corte da percepção. Pele macia, quente, gostosa! Um camaleão úmido. Magenta de desejo, ou de paixão. Pode ser áspera se quiser; mocinha e vilã num único ser. Inconsciente e inconsequente.

Faz sofrer, chorar, sorrir, gargalhar. Se você souber usá-la, os melhores frutos estão reservados; caso contrário, o revés é garantido. Gosta de ser bem tratada, bem servida e bem aventurada. Simples assim, o prazer é garantido. Um gemido, um sussurro, um carinho no ouvido. Arrepios! Tem prazer, paixão, maldição; mil coisas; um turbilhão. O céu é o limite sempre, sempre... e de novo! Só pode entender quem conhece a minha língua.




Autor: Jorge Pedrosa

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Alcoolismo na juventude

Um pouco de consciência da Adega a todos.

Programa veiculado no programa Mistura Universitária, da rádio CBN-ES e produzido por alunos de jornalismo da UVV.

Um novo sentido na Adega.

* O zelador encontrou problemas para adicionar o áudio no Blogger, então segue o link de destino. Para quem tiver tempo, o material é válido. Desculpe-nos o transtorno. Não é vírus: a Adega de Letras é climatizada e esterilizada.

A Adega agradece.
@AdegadeLetras

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